Projeto da 1ª planta-piloto offshore do Brasil avança no RN, com apresentação à comunidade

9/08/2024   12h08

Em reunião técnica nesta semana, o SENAI-RN apresentou infraestrutura prevista, estudos envolvidos, objetivos e resultados esperados em Areia Branca, município escolhido pela instituição como sede do empreendimento

 

O projeto de instalação da primeira planta-piloto de energia eólica offshore do Brasil – unidade de pesquisa concebida para nortear investimentos no mar e prevenir impactos com a chegada dessa nova atividade industrial ao país – avançou nesta semana, no Rio Grande do Norte, com uma série de discussões que envolveram a população, empresas e o setor público.

 

Em reunião técnica na última terça-feira (06), o SENAI-RN apresentou infraestrutura prevista, estudos envolvidos, objetivos e resultados esperados em Areia Branca, município potiguar a 330 km da capital, Natal, escolhido pela instituição como sede do empreendimento. 

 

Na terça e na quarta-feira (08), empresas nacionais e estrangeiras parceiras no projeto participaram de visitas na área e na sede do SENAI. 

 

“Nós estamos mostrando aqui algo que não é mais só uma ideia. É um projeto que está extremamente maduro e que vemos como oportunidade que nasce para a comunidade local, para os trabalhadores do mar, para o Ibama conhecer as condições do ambiente, para as indústrias fortalecerem seus negócios, e para o SENAI poder desenvolver tecnologia e formar pessoas”, disse o diretor do SENAI-RN e do Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER), Rodrigo Mello. 

 

A geração de energia eólica offshore, ou seja, com turbinas instaladas no mar, é uma atividade industrial que começou há menos de 10 anos no mundo, observou o executivo. 

 

No Brasil, o desenvolvimento do setor está em estágio inicial, à espera de regulamentação, mas pesquisas e sinalizações de investimentos ganham cada vez mais corpo.

 

“Ainda não existe, no país, nenhum aerogerador instalado no mar. E nós estamos, assim como a população, ansiosos para aprender mais a respeito. Com os estudos que já realizamos, conhecemos as condições físicas, as condições da nossa economia, as condições biológicas e o vento, mas precisamos ir além. É uma oportunidade que nasce em Areia Branca para dar respostas ao Brasil”, complementou o diretor.

 

Planta-piloto

 

De acordo com o projeto, a energia gerada pelos aerogeradores vai abastecer o Porto-Ilha de Areia Branca, com a ajuda de cabos submarinos que irão transportá-la até uma subestação no terminal.

 

A planta-piloto é um sítio de testes, em condições reais de operação, para futuros aerogeradores que serão implantados no mar do Brasil. 

 

O projeto está em fase de licenciamento ambiental no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama)

 

A expectativa do SENAI-RN é que a licença saia ainda este ano e que o início da operação ocorra em 2027. 

 

Estudos ambientais para avaliação do Ibama foram entregues em julho, com levantamentos de dados do meio físico da região – o que inclui relevo, clima e oceano – do meio biótico (fauna e flora marinhos) e de aspectos socioeconômicos envolvendo população, paisagem, infraestrutura pública e atividades como a salineira, a pesca industrial, a artesanal e a mariscagem, de Areia Branca e dos municípios de Grossos e Tibau, que estão no entorno.

 

O documento contém mais de 600 páginas e foi elaborado por geólogos, geógrafos, biólogos, engenheiros civis, ambientais, navais e oceanógrafos que compõem a equipe de pesquisadores do ISI-ER, principal referência do SENAI no Brasil em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) em energia eólica, solar e sustentabilidade, e braço da instituição à frente do projeto.

 

A reunião técnica em Areia Branca é uma etapa prevista no processo de licenciamento. O principal objetivo, segundo o Ibama, é a apresentação de informações que trazem impacto à população e a coleta de ideias que serão utilizadas para balizar a tomada de decisão sobre o licenciamento. 

 

Pescadores que atuam na área e outros representantes da comunidade com os quais o ISI-ER dialoga há aproximadamente um ano, para construção do projeto, participaram do evento. Em meio ao grupo, Chicão do Mel, presidente da Colônia de Pescadores de Areia Branca, ressaltou a importância da discussão e citou o SENAI como um “elo entre o setor pesqueiro e os empreendimentos que venham a ser instalados na região”.

 

Pescadores que atuam na área e outros representantes da comunidade com os quais o ISI-ER dialoga há aproximadamente um ano, para construção do projeto, participaram do evento

 

“Eu tenho dito para os pescadores que é em reuniões como essas que a gente vai conseguir diminuir a dificuldade e a distância do pescador. Eu vejo como de suma importância o envolvimento do setor”, frisou ele.

 

A reunião também contou com a presença do Ibama, da Marinha do Brasil, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico (Sedec), do Centro de Estratégias em Recursos Naturais e Energia (Cerne), do Conselho Global de Energia Eólica (GWEC), da Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern) e de empresas anunciadas como parceiras no projeto: a Goldwind Brasil, de origem chinesa, a espanhola Esteyco, a potiguar Dois A Engenharia, a italiana Prysmian e a Intersal, consórcio que opera o Porto-Ilha de Areia Branca – terminal salineiro ao qual a planta-piloto estará diretamente conectado.

 

Aerogeradores serão instalados a 4,5 km do Porto-Ilha, fora da zona de pesca

 

Mariana Torres, pesquisadora do ISI-ER: “Projeto pode trazer muita informação e recomendações para a chegada dessa nova indústria ao país”

 

O projeto do SENAI prevê a instalação de dois aerogeradores, com potência somada de 24,5 Megawatts (MW).

 

As máquinas serão implantadas a 4,5 km de distância do Porto-Ilha de Areia Branca, a  uma profundidade de 7 a 8 metros no mar. 

 

A região é considerada rasa e, segundo estudos desenvolvidos pelo ISI-ER, está distante de recifes de coral e das tradicionais zonas de pesca.

 

O sistema de implantação da usina se baseia em um modelo criado na Espanha, pela Esteyco, que possibilita a montagem total das torres em terra e que elas sejam então levadas até o destino, no mar, com o apoio de rebocadores – ou seja, sem a necessidade de grandes estruturas de navios, atualmente escassas e caras no mundo. As máquinas são então posicionadas no fundo, sem perfuração.

 

O projeto prevê a instalação da planta a 20km da costa – nas proximidades do Porto-Ilha, onde o SENAI-RN realiza medições do recurso eólico há mais de dois anos, o maior tempo registrado no Brasil.

 

A expectativa, com a planta, é analisar o desempenho dos equipamentos de geração de energia eólica offshore em condições do mar equatorial brasileiro. Segurança e função, desempenho de potência, cargas mecânicas, ruídos, suporte e afundamento de tensão, além de qualidade da energia poderão ser avaliados na área, mas não só isso. 

 

“A tendência é gerarmos um ambiente de muitas respostas”, disse, durante a reunião, a pesquisadora do ISI-ER, Mariana Torres, que lidera a equipe envolvida nos estudos ambientais e socioeconômicos do empreendimento.

 

“O projeto de desenvolvimento da usina piloto tem o objetivo de estudar a chegada da eólica offshore no Brasil. A gente acredita que ele vai contribuir em várias vertentes de estudos na área, para elaboração de projetos, definição de tecnologias e métodos de construção, por exemplo, e que vai conseguir responder a muitas perguntas do ponto de vista ambiental”, complementou ainda.

 

Empresas nacionais e estrangeiras parceiras no projeto participaram de visitas na área e na sede do SENAI: Expectativa é instalação da planta-piloto a 20km da costa, nas proximidades do Porto-Ilha

 

De acordo com o projeto, a energia gerada pelos aerogeradores vai abastecer o Porto-Ilha de Areia Branca, com a ajuda de cabos submarinos que irão transportá-la até uma subestação no terminal. Entre os objetivos com a conexão estão a substituição de combustíveis fósseis na operação do porto e a consequente redução das emissões de gases do efeito estufa.

 

Pesquisadores vão aprofundar estudos e farão monitoramento contínuo da fauna e da qualidade da água

 

A apresentação realizada durante a reunião técnica mostra imagens do fundo do mar e outras informações que, de acordo com a pesquisadora do ISI-ER, Mariana Torres, revelam que a área escolhida para a usina “é limpa, como um deserto”, ou seja, sem a presença de recifes de coral, de áreas de preservação ambiental ou utilizadas para atividades de pesca.

 

“Estudamos recifes de coral, comunidades bentônicas – as conchinhas que ficam misturadas na areia, no fundo do mar – aves, mamíferos marinhos, tartarugas e peixes e vamos fazer um monitoramento contínuo dessa fauna, dos ruídos subaquáticos, da qualidade da água, da qualidade do ar durante a construção e isso tudo vai dar muitas respostas mais para frente”, acrescentou a pesquisadora.

 

Esse projeto, ressaltou ela, “tem um grande impacto nacional”. “Ele pode trazer muita informação e recomendações para a chegada dessa nova indústria ao país. É um projeto para fins de pesquisa, um piloto que tem o porte reduzido, com dois aerogeradores, mas que tem condições de ser muito grande em termos de aprendizado e de prevenção de impactos relacionados a essa indústria”, frisou ainda.

 

Respostas

Entre 1 e 2 anos para aprofundamento de pesquisas são previstos antes da efetiva instalação dos aerogeradores.

 

O objetivo do Instituto SENAI é estudar, entre outros aspectos, se a instalação das usinas offshore provocará alterações no comportamento dos animais marinhos e das aves, mudanças na flora marinha, no fundo do mar, nas atividades existentes na área, na geração de empregos, no potencial crescimento da economia, além da necessidade de cursos profissionalizantes. 

 

Dúvidas relacionadas foram apresentadas pela comunidade durante a reunião técnica, na última terça-feira. Antonio Medeiros, coordenador de Pesquisa & Desenvolvimento do ISI-ER, explicou que a intenção com o projeto é buscar respostas para que a chegada das indústrias do setor gere crescimento e não impactos negativos.

 

Ele também ressaltou que o projeto vai seguir todas as normas estabelecidas pela Aeronáutica e a Marinha, evitando riscos ao tráfego de aeronaves e de embarcações na região.

 

Antonio Medeiros, coordenador de Pesquisa & Desenvolvimento do ISI-ER, explicou que a intenção com o projeto é buscar respostas para que a chegada das indústrias do setor gere crescimento e não impactos negativos

 

“Estudos como esse, de pesquisa e desenvolvimento”, explicou o pesquisador, “ajudam a conhecer ainda mais o ambiente, com uma coleta cada vez maior de dados para que a previsão do mar seja mais exata e contribua com atividades econômicas que existem no meio”. 

 

Se haverá afastamento de animais ou se projetos como esse irão naturalmente atrai-los, e, se houver afastamento, como viabilizar medidas para compensar isso, são questões levantadas pelos pescadores e que estão entre os focos dos pesquisadores no projeto. 

 

“Nós vamos fazer pesquisa de ruído, por exemplo, para enxergar se isso vai acontecer ou não e dizer no nosso estudo qual foi o comportamento registrado. São respostas que a gente só conhece com pesquisa e temos que criar o primeiro projeto para viabilizar o estudo”, disse Medeiros.

 

“Projetos como esse”, de acordo com o pesquisador, também “ajudam a desenhar as profissões do futuro”. São caminhos para a criação de itinerários formativos, ou seja, para definir os conhecimentos necessários aos profissionais que atuarão na indústria e os meios para que sejam qualificados para o trabalho no ramo ou para investirem em frentes como o empreendedorismo.

 

Um projeto em desenvolvimento no SENAI prevê a criação de uma escola de mergulhadores na região. A atividade é realizada há décadas por pescadores, e o objetivo seria aprofundar conhecimentos teóricos e práticos com base em normas de saúde e segurança do trabalho para que possam também aproveitar potenciais oportunidades de emprego no setor eólico offshore.

 

 “Agora, dependemos da chegada da atividade que vai financiar isso e do bom desempenho dela na região”, disse o diretor da instituição, Rodrigo Mello. 

 

Texto e fotos: Renata Moura