O Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e a Cooperação Técnica Alemã para o desenvolvimento sustentável (na sigla alemã GIZ – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit) acabam de fechar uma parceria para a produção de Combustível Sustentável de Aviação (SAF – sigla em inglês para Sustainable Aviation Fuel) no Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) localizado em Natal, Rio Grande do Norte. No total, serão investidos mais de R$ 4,5 milhões até 2023 para obras de adaptação dos reatores e dos equipamentos já existentes para produzir o combustível, visando à redução de emissões de gases do efeito estufa na aviação.
O querosene sintético renovável, ou e-querosene, como também é chamado, será produzido a partir da glicerina, um co-produto do biodiesel – por meio de um processo químico denominado rota Fischer-Tropsch. A glicerina será transformada em gás de síntese (monóxido de carbono e hidrogênio verde) e, após processos químicos e industriais, será transformada em combustível. Como a produção é sustentável, ao ser consumido o combustível não contribuirá para o aquecimento global – já que o balanço de carbono tende a ser neutro.
Já existe regulamentação nacional – da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) – e internacional – ASTM (American Society for Testing and Materials) – indicando que o combustível renovável pode ser misturado com querosene de aviação de origem fóssil em até 50% da composição.
“A mobilização da sociedade, governos e empresas com a redução das emissões é cada vez maior e no setor de aviação não é diferente. Essa parceria é muito importante para desenvolver alternativas para a descarbonização da aviação brasileira, bem como valorizar vocações locais combinando energias renováveis e co-produtos industriais para a produção de SAF”, explica o Dr. Markus Francke, diretor do Projeto H2Brasil da GIZ.
Em 2019, o Instituto publicou o estudo “Geração de combustíveis sintéticos de aviação a partir da glicerina oriunda da produção de biodiesel” que contou com o apoio direto da GIZ, em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI). “Esse apoio viabilizará a concretização desse estudo com o desenvolvimento de uma planta piloto para produção desse combustível alternativo para aviação no ISI-RN”, explica Eduardo Soriano, responsável pelo projeto da GIZ no MCTI.
O projeto
A duração será de dois anos, período em que os pesquisadores também deverão estimar quando o novo combustível poderá chegar ao mercado. “É uma resposta que teremos no decorrer do processo de pesquisa e desenvolvimento, iniciado agora”, diz o diretor do ISI-ER, Rodrigo Mello.
Estudos desenvolvidos nos últimos 10 anos por pesquisadores que lideram o projeto, por meio do Laboratório de Sustentabilidade do Instituto, já identificam, segundo ele, vantagens no uso da glicerina. “Verificou-se, por exemplo, que a emissão de CO2 para produção de combustível sintético com essa matéria-prima é praticamente nula”, observa o diretor, afirmando que o projeto em parceria com a Alemanha é mais um passo importante nos estudos que o Centro realiza, com possíveis efeitos em escala global.
“É um projeto em parceria Brasil e Alemanha, mas a solução que trabalharemos para desenvolver certamente será uma opção para o mundo todo, onde houver condições de produção dessa matéria-prima”, frisa Mello.
Por ter origem orgânica e poder ser misturado com o QAV tradicional – produzido a partir de fontes fósseis – o Combustível Sustentável de Aviação tem, de acordo com ele, potencial para evitar que um volume importante de gases de efeito estufa seja lançado na atmosfera, “colaborando com as metas de carbono zero em 2050 e de redução de emissões até 2030 no Brasil, assim como com compromissos ambientais assumidos por outros países”.
A glicerina é um co-produto da produção de biodiesel. A abundância no mercado brasileiro é outra vantagem enxergada no projeto. “Temos mais de 400 milhões de quilos de glicerina por ano produzidos no Brasil e transformar essa matéria-prima em energia limpa está certamente entre as destinações mais nobres que o país pode dar a ela, em especial em um trabalho voltado à mitigação de gases do efeito estufa”, complementa o diretor do ISI-ER.
O projeto, no Instituto, é coordenado pela pesquisadora Fabiola Correia, doutora em Ciências e Engenharia de Petróleo, com atuação, no ISI-ER, em linhas de pesquisa que envolvem Transformação química de sólido/líquido/gás; sistemas catalíticos; processos de produção de hidrogênio verde; caracterização e processamento de fluidos produzidos; gaseificação de biomassa e Captura e Estocagem de CO2.
O ISI-ER
O Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER) faz parte da maior rede privada de institutos de pesquisa, desenvolvimento e inovação criada no Brasil para atender as demandas da indústria, composta por 26 Institutos SENAI de Inovação. A Rede tem como foco a pesquisa aplicada, o emprego do conhecimento de forma prática no desenvolvimento de novos produtos e soluções customizadas para as empresas ou de ideias que geram oportunidades de negócios. Desde que foi criada, em 2013, mais de R$ 1,2 bilhão foram mobilizados em 1.332 projetos de PD&I. O ISI-ER está em operação no Hub de Inovação e Tecnologia (HIT) do SENAI-RN em Natal desde 2018, e foi oficialmente inaugurado em junho de 2021, com a conclusão das instalações e a operação plena dos laboratórios.
O SENAI
Criado em 1942 por iniciativa de empresários do setor industrial, o SENAI é a maior instituição de educação profissional e tecnológica da América Latina. Representa uma rede de escolas profissionais de nível secundário sem fins lucrativos, estabelecida e mantida pela Confederação Brasileira da Indústria. Promove programas de educação técnica que vão desde cursos de qualificação de curto prazo até programas de mestrado que abrangem uma ampla gama de tecnologias industriais. O SENAI opera uma rede de centros de tecnologia e pesquisa no Brasil, que trabalham em estreita relação com indústrias e empresas do setor privado, atuando em setores econômicos chave. Fomenta a inovação e promove sinergias construtivas entre academias, instituições de pesquisa, entidades governamentais, indústrias, empresas do setor privado, start-ups e organizações internacionais.
O H2V e a Cooperação Alemã
A Cooperação Brasil-Alemanha para o desenvolvimento sustentável trabalha há décadas nas áreas de energia sustentável e eficiência energética. Mais recentemente, vem apoiando o aprimoramento das condições legais, institucionais e tecnológicas para a expansão do mercado de hidrogênio verde no país. Nos próximos anos, com o apoio do Ministério de Minas e Energia (MME) e do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), serão implementadas ações para a construção de laboratórios, desenvolvimento de novas tecnologias, fomento ao desenvolvimento de ideias e projetos inovadores, financiamento de estudos e pesquisas, treinamentos e capacitações profissionais na área do hidrogênio verde, dentre outras.